Alargamento da Orla de João Pessoa: Dois Dedos de Prosa Pt. 1
- Alcides H. Silva
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- 27 de fev. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 1 de mar. de 2023
A insatisfação com o - supostamente ainda em desenvolvimento, mesmo com data de início de obras já estabelecida - projeto de Alargamento da Faixa de Areia da Orla de João Pessoa parece ser unânime. Não à toa, tão logo o início das obras foi alardeado para dezembro, uma audiência pública para discutir o tema foi rapidamente organizada. Porém, nesse momento de acirramento de ânimos, é necessário ter cautela. Argumentar plenitudes à torto e a direito, no fim, nos levará a mais um embate polarizado, raivoso e improdutivo. Não é coincidência que neste exato momento, temos o que parece ser dois lados opostos justificando suas teses com base no mesmo argumento: recuperação e preservação do meio ambiente. Claramente algo não está correto e a população, de modo geral, passa a ter a compreensão plena dos fatos comprometida.

Por isso, e antes de mais nada, é importante criticar a FORMA como a Prefeitura de João Pessoa tem conduzido esse tema. Trata-se de mais um projeto de grande impacto socioambiental que parece ser feito a toque de caixa e elucubrado pelos gestores públicos escondido do crivo da população pessoense. A situação é tão desconcertante que a discussão sobre o alargamento da orla está passando à margem da própria revisão do Plano Diretor da cidade, que seria o espaço adequado para se tratar desse tema. Hoje, o que temos é uma Minuta do Plano Diretor elaborada com 4 anos de atraso e que antes mesmo de ser apreciada pela Câmara Municipal, já foi rasgada pela prefeitura de João Pessoa, ao tirar sabe-se lá de onde a ideia de alargar a orla pessoense. Todas as diretrizes e ações traçadas por técnicos e pela sociedade civil organizada - mesmo com participação reduzida - que foram listadas no Plano Diretor acabaram por ser relegadas. Dentre elas, podemos rapidamente listar algumas, nos remetendo ao art. 75 da Minuta, como a Reestruturação Urbana da Mata do Buraquinho, da Ilha do Bispo, de Centralidades Emergentes na Cidade, assim como a própria Reestruturação Urbana do Centro Histórico.
Claro que, enquanto crítica à FORMA, também é necessário realizarmos uma autoanálise. Onde estava toda essa comoção em uníssono quando a Estação Ciência foi erguida no topo da falésia do Cabo Branco? Quando o Centro de Convenções foi erguido no meio da mata? Onde está essa comoção agora mesmo para tratar do Polo Turístico e do Parque da Cidade que substituirá o terreno do Aeroclube, desperdiçando uma oportunidade única de adensamento populacional qualificado e inclusivo para a cidade? O projeto de alargamento da faixa de areia é apenas a cereja no bolo de libertinagem que a Prefeitura de João Pessoa, e seus diversos prefeitos ao longo dos anos consideram ter para agir a despeito do bem comum.
Agora, no que tange ao MÉRITO do projeto de alargamento da orla, não podemos fazer um recorte tendencioso de correlatos, destacando apenas experiências que supostamente falharam. Não é belo ver as motivações e o resultado do que foi feito em Camboriú, mas não podemos, por isso, dizer cinicamente que Copacabana e o Recife Antigo são completos erros. O impacto socioeconômico dessas duas experiências é notável, sendo uma delas um dos cartões postais do Brasil e a outra, a casa de um dos maiores polos tecnológicos do país. No entanto, não estamos mais nos séculos XIX e XX e o nível de criteriosidade para se efetuar uma intervenção como essa subiu consideravelmente. Nesse ponto, reside o impasse. Como criticar consistentemente a proposta de alargamento de orla se não possuímos em mãos os estudos de impacto dessa ação na vida marinha? No comportamento das correntes marinhas costeiras? No comportamento dos sedimentos da praia? No sucesso em assegurar a redução da erosão da Falésia do Cabo Branco? Ou no próprio sucesso em reduzir o avanço da linha de costa da orla de João Pessoa?
Tudo ainda parece ser muito impreciso. O que é preocupante para algo que se pretende iniciar nos próximos 9 meses e que supostamente já se sabe que custará algo em torno de 200 milhões de reais. Por isso, é fundamental cobrar transparência da administração pública, assim como a correta produção destes diversos estudos pendentes. Com isso em mãos, poderemos efetivamente avaliar os méritos de tal proposta. No entanto, o que se pode deixar posto desde já é uma CONDIÇÃO CLARA, a qual todos parecemos endossar: O Alargamento da Orla de João Pessoa em 20, 30 ou N metros não vale a destruição de todo o ecossistema marinho que nossa cidade dispõe. Claro, pelas motivações ambientais óbvias que alguns levam mais em conta do que outros, mas também e principalmente por motivações socioeconômicas que não podem passar despercebidas. Há, em João Pessoa e imediações, algumas dezenas de milhares de pessoas que tiram seu sustento do turismo. Seja através da venda de alimentos, serviços de hospedagem, guia, locação de meios de transporte e equipamentos esportivos, realização de eventos, vendas de suvenires, peças artesanais e assim por diante. Estamos falando de todo um ecossistema empreendedor que depende da capacidade de atração que João Pessoa possui sobre turistas dos mais diversos locais do mundo, e que hoje está única e exclusivamente atrelada às belezas naturais que dispomos. Claro, João Pessoa está constantemente tomando para si as belezas de Cabedelo e Conde, mas ainda há coisas que são genuinamente pessoenses em sua orla, como as piscinas naturais do Seixas e Picãozinho. Belezas naturais essas que certamente serão afetadas pelo alargamento da orla de João Pessoa. Agora, fica a questão, em que intensidade? Enquanto não dispomos de informações melhor qualificadas e receamos o início atabalhoado de uma obra faraônica, é sábio aceitar que a medida mais adequada e conservadora a ser tomada, no momento, é ser contra.










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